
AS BASES DO JORNALISMO

FILMES CONTEXTUALIZADOS
Rod Lurie, 1994
O RESGATE DE UM CAMPEÃO
O filme traz o estereótipo de jornalista apontado por Isabel Travancas (1992), em que o personagem é jovem e corre atrás de um furo para a capa. Há também a questão da pressa que ajuda na construção da imagem da profissão. O jornalista protagonista do filme, Erik Kernan, busca no ex-boxeador que vive nas ruas a sua chance de emplacar a capa e ver sua carreira deslanchar, mas o problema da escassez de tempo faz com que seu trabalho não tenha o resultado desejado.
“O resgate de um campeão” é baseado em fatos reais, o que segundo a autora Camila Cristina Galvão (2013), confere ainda mais poder às imagens e estereótipos relacionados ao jornalista. Dentre as características comuns sobre esses profissionais da comunicação.
apontadas por ela que aparecem no filme em análise são: o de não ter limite entre a vida profissional e pessoal, ter dificuldade com relacionamentos duradouros, não ter horário definido para exercer seu trabalho e a ambição (embora o personagem não seja exageradamente ambicioso). Outro ponto que também é destacado por Galvão é a relação com a profissão, a qual é possível perceber algumas características no filme, como: utilizar a infância para justificar a escolha da profissão (no caso de Kernan, a influência de seu pai no meio e a sua ausência o levaram a escolher a profissão com o objetivo de ser como seu pai, um jornalista que cobre lutas de boxe); o objetivo principal é alcançar um lugar na TV, buscar a fama, o sucesso e os conflitos no ambiente de trabalho. Ademais há também a relação inapropriada com a fonte.
Steven Spielberg, 2018
THE POST
O filme gira em torno da redação do jornal The Washington Post. Meryl Streep, dona do jornal local que está prestes a lançar investimentos na Bolsa de Valores. Questões antiéticas são retratadas no filme, quando o editor-chefe pede ao estagiário para espionar o The New York Times para saber em que estavam trabalhando e de repente, descobrir algum furo.
Outro ponto importante a se destacar, é durante as reuniões sobre os investimentos que o jornal pretendia fazer, onde Meryl claramente não tinha voz dentre os homens presentes, justamente por ser mulher e não receber a devida credibilidade pelo mesmo motivo.
O clímax do filme acontece quando a equipe do jornal recebe documentos com informações que foram retirados do Pentágono. O filme não mostra o que está escrito nesses documentos, o foco não era mostrar o seu conteúdo. A tensão está concentrada em duas coisas: eles tinham apenas oito horas para ler todo o documento e a decisão se a matéria seria ou não publicada, já que continha informações restritas do Governo e eles certamente seriam, no mínimo, processados.
Sobre a decisão de publicação ou não da matéria, isso cabia à dona do jornal, Meryl Streep, sendo assim ela é o gatekeeper. Mais uma vez, seus colegas mostram uma falta de confiança em sua capacidade de tomar decisões importantes e a questionam o tempo todo.
James Vanderbilt, 2016
CONSPIRAÇÃO E PODER
O filme Conspiração e Poder é baseado na história da jornalista Mary Mapes, ex-produtora do programa de notícias 60 minutes. O enredo se desenvolve a partir da suspeita de Mary, de que o então presidente e candidato à reeleição para o governo americano, George W. Bush, mentiu sobre a participação na Guerra do Vietnã.
A história se desenvolve quando Mary, como produtora do jornal, monta uma equipe investigativa para desvendar o passado do Bush filho. A denúncia toma forma quando ela recebe de uma fonte, documentos internos que comprovam a não participação do presidente na Guerra.
Outro personagem essencial no filme é o jornalista e apresentador do 60 minutes, Don Hewitt. Mary e Don são pressionados pelo CEO da emissora CBS news a divulgar a apuração e a reportagem antes do prazo estabelecido o que deixou a informação vulnerável.
Durante o filme, várias acusações são feitas sobre a veracidade dos documentos, e como as pessoas que poderiam confirmar a sua autenticidade já estavam mortas, toda a apuração foi tida como mentira. O resultado foi o pedido de desculpas público feito por Don durante um programa, e a decisão do CEO de demitir Mary e Hewitt.
Bruce Robinson, 2012
O DIÁRIO DE UM JORNALISTA BÊBADO
O filme relata a história do jornalista americano Paul Kemp, que escreve um dos novos modelos de se fazer jornalismo na época, o Gonzo. E Paul se muda para Porto Rico, para novas oportunidades. E chegando lá, decide trabalhar no pequeno e quase falido jornal The San Juan Star, que é especializado no noticiário de vender o país para os turistas. E lá na ilha ele conhece duas pessoas que interferem em sua vida e convicções profissionais o Hal Sanderson, um relações públicas muito influente na ilha, que ganha dinheiro com a especulação imobiliária e convida Paul a participar de um grande e desonesto projeto no país. A segunda é Chaneault, namorada de Sanderson e a grande paixão de Paul no filme.
Kemp é direcionado para fazer o horóscopo e cobrir o cotidiano dos turistas norte-americanos que vão a Porto Rico passar as férias. E ao ir a uma briga de galos com Bob Sala, Paul passa a conhecer a sociedade local e sua realidade, e descobre os bairros pobres e a exploração ao meio ambiente e às pessoas. Como jornalista, escreve para denunciar o que viu, porém, é censurado pelo editor Lotterman, que quer que o jornal apenas lucre e não publique a verdade.
Só que o personagem Paul Kemp passa a refletir sobre o assunto quando se envolve com Hal Sanderson que coordena o lançamento de um gigantesco complexo hoteleiro em uma parte intocada de Porto Rico, o que resultaria em sérios danos ambientais e sociais. O trabalho de Paul seria produzir textos publicitários sedutores objetivando manipular a opinião pública para evitar grandes resistências ao projeto.
Depois que Kemp e Bob Sala usam droga e se embebedam, Kemp conversa com uma lagosta e tem uma epifania e com isso ele compreende a relação entre explorador e explorado e a atuação de Sanderson no país. Buscando se redimir, Kemp entrega ao editor uma reportagem denunciando o empreendimento que Hal pretendia construir, mas é prontamente recusada porque Lotterman estava em fuga diante da inevitabilidade de fechamento do jornal, embora nenhum deles ainda soubesse.
Robert Redford, 2005
QUIZ SHOW
O personagem analisado não é jornalista e sim um advogado. Ele segue seus instintos e desconfia de um programa de televisão após ler em um jornal sobre um inquérito que foi encerrado pelo juiz, o que não acontecia desde 1869. Podemos analisar o perfil do personagem, Dick Goodwin, como curioso, insistente, destemido, que faz de tudo para desmascarar o programa de televisão, Quiz Show, que não passa de uma armação.
A falta de ética no filme fica evidente quando os produtores do programa de televisão fazem uma reunião com Charles Van Doren para tentar contratá-lo e falam que se ele tivesse interesse em participar do “Quiz Show” ele não precisaria se preocupar com as perguntas pois ele as receberia antes de começar a rodada. As perguntas que deveriam ser guardadas em um cofre, são passadas para Charles antes do programa começar, assim, ele faz a audiência do programa aumentar e ganha muito dinheiro com a manipulação do público, que acreditava que o vencedor sabia de todas as respostas apenas com seu conhecimento.

TEORIAS EM COMUM
Dentre os pontos em comum a todos os filmes é possível perceber o trabalho investigativo do jornalista. Como apontam os autores Tom Rosenstiel e Bill Kovach (2003) no livro “Os elementos do jornalismo: o que os jornalistas devem saber e o público exigir” toda matéria é investigativa e mesmo as de serviço podem virar investigativas a partir da apuração. Todos os filmes assistidos pelo grupo apresentam de alguma forma investigação. As produções como “The Post: A Guerra Secreta”, “Quiz Show - A Verdade dos Bastidores” e “Conspiração e Poder” representam a função da imprensa como guardiã da sociedade. Enquanto em o “O Resgate de um a Campeão” o problema é a falta de investigação - ou ainda uma investigação mal feita - que leva o protagonista a publicar uma mentira. E no filme “Diário de um jornalista bêbado” há a investigação do jornalista, só que ele é barrado pelo jornal.
Outro ponto em comum encontrado nos filmes “The Post: A Guerra Secreta”, “Conspiração e Poder” e “O Resgate de um a Campeão” é a relação de confiança com a fonte. Todas as obras apresentam uma certa dependência do jornalista com relação a seu informante. Os dois primeiros filmes dependem da informação concedida pela fonte para fazer denúncias políticas que impactam a vida de muitas pessoas. Em “O Resgate de um campeão” a relação de confiança surge da proximidade entre fonte e entrevistado e da urgência da publicação da matéria, que faz com que o protagonista não seja crítico e confie - mesmo sem investigar - na sua fonte. Já no filme “Conspiração e Poder” a fonte mente intencionalmente para a jornalista sobre a origem da documentação, apesar de ainda assim ser considerada verdadeira pela equipe responsável pela apuração, a notícia perdeu completamente a credibilidade para a população. Uma relação mais íntima entre a fonte e o personagem Dick Goodwin em “Quiz Show” pode ser percebida no momento em que o advogado participa do almoço em família do Charles Van Doren para conseguir informações e conhecer melhor sua fonte.
Além disso, o papel de gatekeeper também aparece nos filmes assistidos, exceto em “Quiz Show - A Verdade dos Bastidores” pois o filme tem o foco na investigação do programa de televisão e não em uma redação de um jornal. No “The Post: A Guerra Secreta” a personagem de Meryl Streep faz esse papel; em “O Resgate de um Campeão” quem o faz é o chefe do protagonista, responsável pelo jornal ‘Denver Times’; no filme “Conspiração e Poder” esse papel é exercido pela produtora do programa jornalístico 60 minutes, Mary Mapes. E no filme “Diário de um jornalista bêbado” o próprio Paul Kemp faz esse papel, onde ele dá sua opinião sobre as corrupções que ocorrem na ilha que está morando.
A rotina produtiva do Jornalista também está de certo modo presente em todos os filmes. Apesar de Dick Goodwin, personagem do filme “Quiz Show” ser na realidade um advogado, ele também levanta e apura as informações, faz uma seleção de conteúdo e as apresenta para o povo, assim como em todos os outros filmes.
Existe uma relação muito forte entre a mídia e a mudança de opinião da população, nem sempre o personagem jornalista tem esse cuidado ao selecionar e no modo de apresentar uma notícia. No caso do filme “Conspiração e Poder”, Mary Mapes não se impõe ao CEO para dizer que sua matéria não estava apurada o suficiente para ir ao ar. Apesar de ter um conteúdo verdadeiro, foi completamente descredibilizada por declarações feitas pelo presidente. Em “Quiz Show” a relação entre a mídia e a mudança de opinião da população, fica evidente em todo o filme, pois o programa de televisão é um dos mais assistidos na época e faz o público acreditar que os participantes vencedores, ganhavam as rodadas justamente. Quando foi divulgado que o programa não passava de uma armação, as pessoas se sentiram manipuladas e enganadas o que fez a televisão perder credibilidade.
A refutação da teoria do espelho apontada por Pena (2013) em que o jornalista é apenas um mediador desinteressado e sem opiniões pessoais também pode ser apontada na relação com os filmes. No filme o “O Resgate de um Campeão” o jornalista tem interesse de que a história que conta lhe garanta prestígio, por isso não se preocupa em investigar sobre o verdadeiro Bob Satterfield. Em “Quiz Show”, o advogado faz de tudo para não envolver Charles Van Doren na acusação, pois ele cria um vínculo com o participante do programa e não quer que a sua reputação seja denegrida. Hoje, a teoria de que o jornalismo é construção da realidade é mais considerada, pois o jornalista escolhe quem ouvir, o que colocar na matéria e o que deixar de fora, por exemplo, além dos interesses pessoais. Para Gentilli (2005) o jornalista é mediador ativo, pois a informação não chega ao receptor em estado bruto, ele as manipula quando faz suas pré-escolhas, pré-filtragem e prejulgamentos.
O fato acima apresentado também pode ser relacionado às discussões do filme “Mercado de Notícias” de Jorge Furtado (2014) que afirma que a informação é tratada como mercadoria, mediante a interesses de quem as veicula. Por isso, alguns assuntos são apresentados insistentemente para o público e outros são “escondidos” de acordo com as posições próprias, do alinhamento com um governo, de quem é dono e de quem patrocina o mercado das notícias. Nos filmes esse é um fato comum nos filmes. Em “Quiz Show” podemos relacionar o próprio programa de televisão como mercadoria, mesmo sendo totalmente antiético, o dono da emissora de tv não deixa sair do ar porque gera muita audiência e consequentemente muito lucro.
Quanto às funções do jornalista encontradas nos filmes estão as funções gerais apontadas por Fernando Kelysson (2010) a todos os jornalistas: informar, transformar a informação em notícia (priorizar, classificar, adaptar, editar, excluir, etc). Além da função de investigar, comum a os profissionais dessa área descritos por Kovach e Rosentiel (2003). Segundo Tiago Lobo, o jornalista, devido a saturação da informação, deve interpretá-las, atribuir-lhes sentido e precisão na produção de um bem intelectual a possibilidade de refletir e, também, de interpretar, sendo um auxílio na difusão de conhecimento. No caso dos filmes escolhidos alguns profissionais exercem a função apontada por Lobo melhor do que outros, os filmes “The Post: A Guerra Secreta” e “Conspiração e Poder” há um visível esforço dos jornalistas em fazer o leitor refletir e tomar decisões a partir dos fatos revelados. Já no filme “O Resgate de um Campeão” o jornalista não tem a mesma preocupação com o público, nem no impacto que sua notícia poderia causar. No filme “Quiz Show” há uma preocupação por parte do advogado em desmascarar o programa de tv que muitas pessoas assistem e acreditam ser justo. E no filme “Diário de um jornalista bêbado”, o jornalista tem a preocupação de informar o público, só que ele é barrado pelo jornal.

FONTES
1 - Felipe Pena – Teorias do Jornalismo (Contexto, 2010)
2 - Mauro Wolf – Teorias da Comunicação (Presença, 2002)
3 - Nelson Traquina – Teorias do Jornalismo (Comunicação, 2004)
4 - Gaye Tuchman – Making News (The Free Press, 1978)
5 - Jorge Pedro Souza – As notícias e seus efeitos. Disponível em: <http://www.bocc.ubi.pt/pag/sousa-pedro-jorge-noticias-efeitos.html>
Acesso em: 4 de maio de 2019.
6 - Afonso Albuquerque – A manipulação editorial e produção de notícia: dois paradigmas da análise da cobertura jornalística política (Vozes 1998)
7 - Stuart Hall - Codificação/ Decodificação. Disponível em:
Acesso em: 5 de maio de 2019.
8 - Jesús Martin-Barbero, Comunicação e Mediações Culturais - 2000
9 - Ilana Polistchuk e Aluízio Ramos Trinta, Teorias da Comunicação: o pensamento e a prática da Comunicação, 2003
10 - Nelson Traquina - Teorias do Jornalismo, Volume II:A tribo jornalística –uma comunidade interpretativa transnacional, 2. (Florianópolis, 2008)
11 - Ruge e J Galtung. - A estrutura do noticiário estrangeiro. Journal of Peace Research, 2, 1965, p. 64-90.
12 - Camila C Galvão - Análise do Estereótipo do Jornalista no Cinema. 2013
13 - Túlio Vasconcelos - O Jornalismo e a Construção da Realidade. Observatório da Imprensa. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/diretorio-academico/ed674-o-jornalismo-e-a-construcao-social-da-realidade/>
Acesso em: 6 de maio de 2019.
14 - Fernando Kellyson - As Funções de um Jornalista. Observatório da Imprensa. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/jornal-de-debates/as-funcoes-de-um-jornalista/>. Acesso em: 6 de maio de 2019.
15 - Alexandre Castro - Teorias do Jornalismo, Universidade e Profissionalização: Desenvolvimento Internacional e Impasses Brasileiros. Disponível em : <http://www.bocc.ubi.pt/pag/castro-alexandre-2013-teorias-jornalismo.pdf>.
Acesso em: 3 de maio de 2019.
16 - Gabrielle Rossi. Jornalismo e Dramaturgia: Representações dos Personagens Jornalistas nas Telenovelas.
17 - Igor Fuser - Mídia e política na teoria da “democracia de platéia” de Bernard Manin. Disponível em: <http://www.compolitica.org/home/wp-content/uploads/2011/01/gt_ipp-igor.pdf>.
Acesso em 4 de maio de 2019.
18 - Antônio Holfeldt, Luiz C. Martino, Vera V. França - Teorias da Comunicação. 2010. p.187 - ?
19 - Cremilda de Araújo Medina -Notícia, um produto à venda: jornalismo na sociedade urbana e industrial. São Paulo: Summus, 1988.
20 - Michel Foucault - Vigiar e Punir. 2.ed. São Paulo: Vozes, 1977.
21 - -Warren Breed. Social Control in the Newsroom: A Functional Analysis. SOCIAL FORCES, v.33, n.1, maio, 1955.
22 - Diário de um Jornalista Bêbado. Bruce Robinson, Nossa Distribuidora. 2012.
TEORIAS DO JORNALISMO
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Blog elaborado na disciplina "Teorias do Jornalismo" da PUCPR orientada pela professora Celina Alvetti